Descrição (Cecília Meireles) Amanheceu pela terra um vento de estranha sombra, que a tudo declarou guerra. Paredes ficaram tortas, animais enlouqueceram e as plantas caíram mortas. O pálido mar tão branco levantava e desfazia um verde-lívido flanco. E pelo céu, tresmalhadas, iam nuvens sem destino, em fantásticas brigadas. Dos linhos claros da areia fez o vento retorcidas, rotas, miseráveis teias. Que sopro de ondas estranhas! Que sopro nos cemitérios! pelos campos e montanhas! Que sopro forte e profundo! Que sopro de acabamento! Que sopro de fim de mundo! Da varanda do colégio, do pátio do sanatório, miravam tal sortilégio olhos quietos de meninos, com esperanças humanas e com terrores divinos. A tardinha serenada foi dormindo, foi dormindo, despedaçada e calada. Só numa ruiva amendoeira uma cigarra de bronze, por brio de cantadeira girava em esquecimento à sanha enorme do vento, forjando o seu movimento num grave cântico lento...