terça-feira, 15 de outubro de 2024

peito aberto... e tempo

 11/01/2000 estava escrito. Era a data do documento. Um papel. O papel estava amarelado. Aquele amarelado de vários tons, que parece de papel antigo. Nas bordas um amarelo mais forte do que no centro, mais claro. No passado, eu acho, o papel era branco. Quando passei o olho pela primeira vez acreditei ser um documento de… sei lá, mil novecentos e sessenta? Porra, ano dois mil! achei que tinha sido ontem o ano dois mil. Será que eu envelheci mais do que imagino? Sou eu um papel amarelado, acreditando ser ainda novinho “em folha”? Amarelado eu sou desde que nasci, dada a genética. Meio desbotado também, dada a genética. Será que os mais novos olham pra minha pele como eu olho pra esse papel amarelado? Os mais velhos me enxergam como papel novo, disso eu sei. Quando digo “os mais velhos”, me refiro ao meu pai, que tem 80 anos. Quando é que a gente sente a idade que tem? Já foi meia vida embora. Cabelos brancos, manchas na pele e as mãos… nossa, olha essas mãos! Genteee. Estão velhas. Cheias de cicatrizes e nada lisas. Algumas manchas aparecendo também. Eu preciso atualizar minha cabeça. Lá nos fundinhos da consciência, num cantinho quase escondido, fica umas produções de pensamento antigo, tipo uma vitrola engasgada que continua a produzir uns sons velhos que não batem muito com a realidade e a passagem do tempo. Essas produções fazem meu eu acreditar que “ainda dá tempo”, que “as coisas vão caminhar pra algo com mais sentido”, tipo um “quando eu crescer”. Aí vem um papel velho do ano dois mil no meio do caminho pra chocar e contrapor essa esperança. Por sorte, se eu acalmo um pouco, a realidade não é tão ruim assim. E o tempo vivido foi aproveitado, do jeito que deu, mas aproveitado, sim. Ainda tem umas boas folhas em branco pra escrever.

Um comentário:

arito disse...

Talvez a vida seja um degradé. A passagem do tempo define os tons de amarelo, condensa as marcas e as experiência criando camadas sobrepostas de vida vivida. Talvez perca a transparência, enquanto inevitavelmente ganha consistência.

Ah não, não há nada de degradado nisso. Quanto mais agregamos, mais enxergamos. E as dores (talvez dispensáveis e odiosas), também compõem a transformação da matiz.

Um dia desses dois amigos de 40 contavam histórias de juventude e, no conselho direcionado a outros dois amigos de 20, se davam conta: tudo isso ainda está prestes a começar. Ainda nem aconteceu.

Quanta coisa. Quantas páginas. Antes. E à frente.